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UX Research com sotaque brasileiro Ou sobre como fazer pesquisas com usuários no Brasil sem apegos acadêmicos ou erros do mercado

Cecília Henriques, Elizete Ignácio, Denise Pilar

*Você terá acesso às futuras atualizações do livro.

Sobre o livro

Para que serve?

UX research com sotaque brasileiro pretende auxiliar pesquisadoras e pesquisadores com diferentes níveis de senioridade na aplicação de métodos de pesquisa, assim como na seleção das técnicas mais adequadas ao seu objetivo e ao contexto em que estão inseridos. Nosso objetivo é compartilhar conhecimentos sobre a prática de pesquisa qualitativa nas organizações, sempre acompanhados da base teórica. Aqui, compartilhamos nossa expertise e nossos pontos de vista sobre a pesquisa de experiência, sem pretender excluir a possibilidade de outros métodos ou abordagens.

O livro busca apresentar a diversidade da pesquisa com usuários de produtos e serviços no Brasil. Tenta dialogar com nossos diferentes sotaques e mostrar como diferentes contextos precisam de distintas abordagens de pesquisa. UX research com sotaque brasileiro foi pensado para suprir uma lacuna em publicações sobre pesquisa de experiência para o contexto nacional, principalmente para melhoria das práticas, qualificação de profissionais e fortalecimento da comunidade de pesquisa de experiência do usuário. Esperamos que este seja apenas o primeiro de tantos outros que estão por vir.

Por ser um campo relativamente novo no país, a pesquisa em UX ainda carece de compartilhamento, no âmbito da comunidade de “UXRs”, de práticas, anseios, acertos e necessidades, para que a pesquisa de experiência possa ser amplamente entendida, definida e praticada nas diferentes organizações. Em parte, isso pode ser feito por meio de discussão e reflexão sobre os resultados das pesquisas de experiência e entendemos que este livro é só o começo. Que possamos testar, aprender, errar, desaprender, aprender novamente e avançar sempre.

Para quem foi escrito?

O livro foi escrito para pessoas interessadas na área, iniciantes e curiosas sobre pesquisa de experiência do usuário. Mas, também, para quem já desenvolve atividades de pesquisa de experiência e deseja ampliar seu entendimento sobre métodos e técnicas, assim como acompanhar o debate sobre temas mais complexos como empatia e alteridade ou, ainda, conhecer diferentes maneiras de apresentar resultados de pesquisa.

Aqui você vai encontrar os elementos essenciais para fazer pesquisa com autonomia e independência. Priorizamos os elementos práticos da pesquisa, ao mesmo tempo em que oferecemos base teórica de qualidade. Apresentamos também casos práticos para mostrar a você como a pesquisa faz toda a diferença para entendermos o usuário de nossos produtos e serviços.

Se você já tem experiência em pesquisa, esperamos que UX research com sotaque brasileiro ajude a organizar seus conhecimentos, adquirir novas habilidades e atitudes importantes para seu crescimento e desenvolvimento como profissional da área. Preparamos um livro que fosse fácil e agradável de ler, mas com muito conteúdo e dicas para que você possa pensar como pesquisador(a) e praticar a pesquisa desde as primeiras páginas. Então, você vai encontrar muitos esquemas, desenhos e diagramas que, esperamos, ajudem a desenvolver seu lado pesquisador.

Boa leitura!

Introdução

Ao escrever este livro, nosso objetivo foi o de proporcionar a você uma compreensão global da pesquisa de experiência (UX Research), enfatizando seus aspectos práticos, sem, contudo, descuidar dos aspectos teóricos e éticos. Este não é um livro acadêmico; a ideia de escrevê-lo surgiu em um minicurso sobre coleta e síntese de dados em pesquisa de experiência do usuário, no qual percebemos que há lacunas formativas tanto na graduação, quanto na vida profissional de quem faz pesquisa, principalmente nas empresas. Ademais, nossa prática profissional como pesquisadoras em diferentes contextos e empresas nos fez desejar um material de linguagem fácil, acessível e condizente com nosso contexto, uma vez que a maioria esmagadora da bibliografia utilizada na área vem do exterior, sobretudo Estados Unidos e Europa.

A experiência do usuário sempre tem dois lados: podemos amar ou odiar os objetos que fazem parte do nosso dia a dia, produtos e serviços podem simplificar ou complicar nossa vida, podem aproximar ou afastar negócios dos clientes. O mais difícil, com certeza, é identificar o que exatamente fará o produto ou serviço agregar mais valor para clientes e usuários. Considerando isso, não falamos sobre design de experiência ou design para experiência, falamos em pesquisa de experiência sob a ótica do usuário, ou seja, da pessoa que vive a experiência, como protagonista da criação dos produtos e serviços – e mostramos como ela pode ser realizada em diferentes contextos. O caminho da pesquisa nem sempre é fácil, mas é o caminho mais curto para criar produtos que atendam às reais necessidades do seu público-alvo.

A área de Experiência do Usuário vem se fortalecendo no Brasil, felizmente! No início, porém, as funções relacionadas ao design tiveram mais destaque e se estabeleceram mais rapidamente. Hoje, temos uma comunidade sólida e em franca expansão, temos publicações e eventos excelentes, inclusive com projeção internacional. Graças a esse crescimento e à consolidação dessa comunidade, a área de pesquisa começou a florescer. A comunidade de Design de UX acolheu e incentivou pesquisadores pioneiros, pois, na verdade, nossos trabalhos se complementam e se enriquecem mutuamente.

Fora da área de Design de UX, entretanto, a pesquisa de experiência teve um pouco mais de dificuldade para ser aceita e incluída nos processos de criação de produtos e serviços. Ao longo deste livro discutimos muitas das questões que explicam essa dificuldade. Examinamos também as bases teóricas necessárias ao trabalho de pesquisa – muitas vezes inacessíveis às equipes profissionais, seja por não estarem disponíveis em nosso idioma, seja por não estarem adequadas à nossa realidade. Incluem-se aqui questões de metodologia de pesquisa, antropologia, psicologia e, mesmo, algumas passagens breves pelo design e pela filosofia.

Além disso, a pesquisa de experiência, assim como toda a área de UX, só pode existir em um contexto de interdisciplinaridade. Como costuma dizer Denise Pilar, nossa colega autora, “as experiências não acontecem no vácuo”: a experiência de uma pessoa é sempre única, porque ocorre em um contexto e é percebida a partir de aspectos que têm importância para ela, bem como por suas crenças, valores, preferências, limitações e vivências anteriores. A experiência de pesquisar não é diferente: nosso trabalho depende de contexto e é influenciado por nossa trajetória profissional e pessoal. O que nos faz bons pesquisadores, contudo, é sabermos identificar e considerar todos esses aspectos, compreendendo sua influência na pesquisa.

Por ser interdisciplinar e fundamentada em várias áreas do conhecimento, a pesquisa de experiência se apropria e adapta métodos e técnicas da antropologia, psicologia, estatística, design, marketing dentre outras, conforme veremos ao longo do livro. Mas como não podemos tratar de tudo em apenas um livro, discutimos aqui, dentre outras coisas, o que nossa prática tem mostrado ser mais importante para o contexto brasileiro: os métodos e técnicas qualitativos. Entrevistas individuais e em grupo, observação, etnografia, pesquisa contextual e testes de usabilidade são bastante discutidos e detalhados, assim como o tratamento e análise dos dados. Observamos sua importância através das dúvidas e dificuldades trazidas por diversos profissionais. Além disso, são métodos com alto impacto nos estudos sobre experiência, porém, muitas vezes negligenciados em relação aos métodos quantitativos ou métricas.

Mas, por que pesquisa de experiência? Quando falamos de pesquisa em experiência, há uma noção de espaço envolvida, assim como questões relacionadas à experiência como conceito. Por exemplo, investigar quais sentimentos estariam associados a uma experiência ao entregar um bom trabalho. Já a pesquisa para experiência tem relação semântica de finalidade e estaria relacionada à promoção de experiências a partir da relação das pessoas com os objetos.

Dito isso, então, nossa opção é falar em pesquisa de experiência, seguindo o sentido gramatical da preposição, que implica posse: o objetivo é conhecer a experiência obtida pelas pessoas por meio dos sentidos. Cada indivíduo tem a sua experiência, ela é única e exclusiva, não sendo possível criá-la ou projetá-la, pois, ainda que alguém tente fazê-lo, o usuário vai reconstruí-la de acordo com sua percepção, visão de mundo e trajetória de vida. Ao longo do livro, essa discussão ficará mais clara.

Para complementar nosso sotaque brasileiro, discutimos as questões éticas que, acreditamos, devem nortear todo trabalho de pesquisa sério. Ainda que tenhamos limitações, existem boas práticas e questões legais as quais precisamos atentar no processo de pesquisa e acreditamos ser importante apresentar como elas se configuram em nosso contexto.

E, para dar a você um “gostinho” da vida como ela é, trazemos cases de pesquisa vividos por nós e por outros profissionais de pesquisa, que revelam nossos acertos e erros, mas que, apesar de tudo, mostram que a pesquisa é fundamental para a criação de produtos e serviços melhores, e – por que não dizer? – de um mundo melhor.

Para uma pesquisa de experiência com sotaque brasileiro

A pesquisa é uma mistura de ações intuitivas e intencionais. Intuitivas porque, às vezes, resultam da curiosidade de quem pesquisa sobre um assunto ou tema. Intencionais porque consistem em um esforço estruturado e organizado. Muitas pessoas partem da sua curiosidade para pesquisar sobre algo e alcançam grandes descobertas. Mas a maioria de nós faz pesquisa por obrigação: na escola, na universidade ou no trabalho. Fazer dessa obrigação algo mais fluido, agradável e organizado é o caminho para que essa atividade seja mais prazerosa.

Praticamente qualquer pessoa pode fazer pesquisa e/ou melhorar suas técnicas de coleta e análise de dados: ao decompor o processo de fazer pesquisa, podemos identificar o que precisamos aprender para alcançar melhores resultados. Por isso, sugerimos que você faça sua própria lista das competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) que considera importantes para formar-se pesquisador. Depois disso, verifique quais você já tem e aquelas que ainda precisa desenvolver. Isso norteará seus próximos passos para aperfeiçoar-se, como a busca de cursos e leituras complementares que auxiliem seu desenvolvimento profissional.

Feito isso, vamos à leitura e à prática! Neste livro, você vai encontrar os elementos essenciais para fazer pesquisa com autonomia.

Na Parte 1, trazemos a fundamentação teórica que consideramos essencial à pesquisa de experiência. Não se trata de uma revisão exaustiva, mas sim de uma base que permite a um iniciante em pesquisa de experiência inteirar-se das nuances envolvidas na prática da pesquisa – um referencial teórico direcionador de futuros aprofundamentos.

Já na Parte 2, abordamos aspectos específicos da prática de pesquisa de experiência. Nela tentamos explorar questões que impactam tanto a execução quanto o resultado de nosso trabalho, como o plano de pesquisa, vieses cognitivos, a coleta de dados e o recrutamento.

Na Parte 3, exploramos os métodos fundamentais da pesquisa de experiência, como a desk research, as entrevistas individuais e em grupo, a etnografia, a observação, a pesquisa contextual e os testes de usabilidade, utilizados tanto no Brasil, quanto em mercados mais maduros.

Na Parte 4, discorremos sobre os resultados da pesquisa de experiência, em especial sobre síntese e análise de dados e comunicação de resultados, cuja importância equivale à fase de coleta dos dados e, por isso, requer igual atenção e rigor para que o objetivo da pesquisa seja atingido.

Na Parte 5, abordamos boas práticas de pesquisa, com ênfase conferida à ética em pesquisa, alinhada à legislação brasileira atual, e incluímos cases nossos e de parceiros, nos quais apresentamos os métodos e técnicas de pesquisa de experiências dentro de contextos práticos de desenvolvimento de produtos e serviços. No final do livro, incluímos alguns materiais complementares que podem auxiliar você em seu dia a dia profissional.

Nosso objetivo, no final, é passar a nossos leitores e leitoras a mensagem de que, sim, é possível fazer pesquisa de experiência no Brasil, apesar dos desafios e dificuldades impostos pela realidade local.

Ufa! Muita coisa, não?!

É muita coisa, sim!! E nem é tudo. Há muito mais o que abordar. Mas convém avançar por etapas, deixando espaço para reflexão e diálogo. Neste livro, os capítulos se entrelaçam e você pode lê-los de forma independente, mas certamente, em cada um, encontrará referências a assuntos tratados em outro capítulo. Então, considere começar por onde quiser, ainda que precise ir e vir na leitura.

Vamos começar?

Prefácios

Mudou, mas continua igual! - Prefácio à segunda edição

Esta é outra expressão brasileira curiosa. Começa avisando que houve uma mudança, para em seguida afirmar que, ainda assim, tudo continua como antes. É a melhor expressão para falar sobre a segunda edição do nosso livro. Tivemos algumas mudanças em seu conteúdo, mas nada tão significativo que mudasse a essência do que nós, autoras, quisemos apresentar na primeira edição.

Em 2018 iniciamos uma trajetória cheia de planos. Quatro anos se passaram e nesse meio tempo houve uma mudança radical no campo de UX: impulsionadas pela pandemia de Covid-19, as empresas se viram forçadas a acelerar seus planos de transformação digital e começaram a contratar profissionais de UX em ritmo acelerado. Profissionais de diversos níveis foram pegos de surpresa com o crescente aumento da demanda na área de UX. Nesse contexto, pesquisadores de experiência também vivem seu boom, pois compreender os usuários se tornou imperativo para que as empresas possam ter sucesso mediante os avanços tecnológicos e transformações sociais.

Com tudo isso, a demanda pelo livro também aumentou. Acreditamos que levaríamos em torno de dois anos para esgotar duas mil cópias, mas em apenas seis meses nosso estoque de livros impressos chegou ao fim. Assim como o mercado, fomos pegas de surpresa! E que grata surpresa! Logo, o plano de uma reedição se antecipou. Entendemos que precisávamos de ajuda e, sem sombra de dúvida, precisávamos profissionalizar o processo de venda e distribuição, nossa principal fraqueza. Ficamos um tempo procurando por uma editora que tivesse afinidade com nossas ideias e pudesse nos ajudar a atender tanto a demanda de livro impresso, como também da versão digital.

E é essa a principal mudança: encontramos na Casa do Código uma parceria, não somente para fazer as pequenas revisões que o livro pedia, mas principalmente para nos permitir alcançar pessoas e mercados que não pudemos atender na primeira edição. Ao acrescentar a versão digital ao já clássico livro impresso, o livro chegará a leitores brasileiros espalhados pelo mundo.

Outra mudança foi quanto aos agradecimentos aos benfeitores do crowdfunding que viabilizou a publicação de UX Research com Sotaque Brasileiro. Seremos sempre muito gratas a todas as pessoas e instituições que nos apoiaram, por isso, os nomes e respectivo reconhecimento a eles poderá ser encontrado apenas na primeira edição. Já em relação ao conteúdo, pouca coisa mudou: fizemos correções gramaticais e alguns conceitos ficaram mais claros. Também incorporamos algumas críticas que recebemos, elaborando um ou outro ponto.

Agradecemos aos leitores e leitoras que explicitamente manifestaram o interesse no livro e aguardaram o tempo que precisávamos para tornar viável esta segunda edição.

Boa leitura!

Cecília, Denise e Elizete

Entre a África e a Bélgica, o nosso Brasil - Prefácio à primeira edição

No raiar dos anos 1980, as populações dos países mais pobres da África iam mal – muito mais do que o mundo jamais poderia supor. A fome estava corroendo boa parte do continente, sem controle. Ainda distante quase uma década da revolução que a web traria, encurtando distâncias e aproximando pessoas, a opinião pública precisava enxergar o que estava acontecendo longe dos olhos da imensa maioria dos países.

Então, no momento certo – e da maneira certa –, entrou em cena o produtor musical Quincy Jones. Era o final de 1984, e Jones, responsável pelo álbum de maior sucesso de todos os tempos, "Thriller", de Michael Jackson, tomou a frente daquela que seria conhecida como uma das ideias artísticas mais geniais do século XX: o movimento "USA for Africa".

A intenção, delicadíssima, era juntar em um mesmo estúdio os maiores cantores e cantoras da época e produzir uma canção cuja renda financiaria o envio de toneladas e toneladas de alimentos para as populações mais necessitadas do continente africano. Convidados por Jones, àquela altura uma lenda do showbiz americano, poucos foram os artistas que ousaram recusar o convite – especialmente porque era um motivo nobre. Na teoria, seria simples: gravar uma canção. Na prática, a história corria o risco de ser bem diferente. E não havia ninguém melhor que Jones para represar um problema que poderia inviabilizar o projeto.

Na manhã de 28 de janeiro de 1985, ao adentrarem o estúdio, cada um dos artistas – de Michael Jackson a Bruce Springsteen, de Diana Ross a Tina Turner – se surpreendeu ao encontrar um aviso: “deixe seu ego na porta antes de entrar”. A gravação transcorreu com surpreendente tranquilidade, a frase entrou para a História – e a arrecadação total do projeto "USA for Africa" chegou a quase 60 milhões de dólares.

Pensar com o próprio ego é como andar de antolhos, já dizia a minha avó, ainda que com pena dos pobres burrinhos que puxavam as charretes da praça em frente à casa em que morava e que não tinham outra opção a não ser olhar para a frente, sempre.

E aqui estamos nós, na terceira década do século XXI, mais de trinta anos distantes do "USA for Africa" e ainda – perigosamente – próximos de uma realidade que nos lembra a dos antolhos. Como perceber o mundo e o que está ao nosso redor, se apenas olhamos para o que querem que notemos ou, pior, para o que nosso ego aponta?

Trabalhar com pesquisa é como deixar o ego à distância, e não atrás da porta, mas dentro de casa, bem longe de qualquer interferência. O que importa, no dia a dia do pesquisador e da pesquisadora, é o outro. Ele é um instrumento, uma ferramenta para estimular que seu objeto de pesquisa – o modelo mental do usuário – se revele.

Ao ler este livro, você verá que não é tarefa fácil. O que as autoras nos trazem, o que flui ao longo de cada um dos capítulos, é a consciência de que, para entender o usuário, é preciso exercitar diariamente o desprendimento.

É prazeroso, é surpreendente – mas é custoso. Vale um alerta, contudo: de forma alguma é algo frustrante. Entender um público, como ele se comporta, o que ele pensa e como ele deseja que o mundo se adapte aos seus desejos é fascinante.

Uma vez, criei para mim mesmo uma armadilha. Como sou da mesma vertente deste livro, e assim sinto necessidade de refletir em meus trabalhos a realidade que nos cerca – a brasileira –, brinco com meus alunos repetindo que “moramos no Brasil, e não na Bélgica”. Ainda que seja como explicar uma piada, é bom esclarecer a frase de efeito (por mais que seja um pouco sem graça): não estamos no Primeiro Mundo e, por isso, de nada adianta nos espelharmos em exemplos que não nos pertencem.

Pois, então, ao cair da noite de um sábado em Porto Alegre, estava pondo os assuntos em dia com Denise Pilar, uma das autoras deste livro, quando, com toda delicadeza e profissionalismo que cabe a uma pesquisadora, fui capturado pela seguinte pergunta: — Você sempre comenta que não moramos na Bélgica, mas no Brasil. Por quê?

Ainda que um tanto confuso, lá fui eu explicar uma história que, a essa altura, já havia deixado de ser engraçada (se um dia foi), quando Denise me interrompeu, curiosa: — É porque morei quatro anos na Bélgica, e fiquei curiosa em saber o porquê de você usar o tempo todo o país como exemplo.

Acabamos, os dois, às gargalhadas – mas é fato que, depois, fui caminhando pensativo para o hotel. Afinal, que autoridade eu teria para falar de um país em que nunca havia pisado? O que eu sabia do dia a dia dos belgas? Ainda que sem intenção, eu havia levado uma bela chamada: como podia estar tirando conclusões sobre uma realidade que eu sequer havia vivenciado, um dia, que fosse?

Fato é que trabalhar com pesquisa muda a forma com que vemos o mundo. Nada mais é percebido como simples, rápido, naturalmente intuitivo e óbvio. Nosso olhar sobre o mundo passa a ser outro, mais profundo e – sim – transformador.

Você está prestes a embarcar em uma viagem sem volta, em que egos, antolhos e frases de efeito não têm lugar. Desejo que, ao terminar esta obra, você tenha a mesma sensação que eu tive: a de que, gentilmente, alguém se aproximou e desembaçou com todo o cuidado as lentes dos meus óculos.

Boa viagem!

Bruno Rodrigues

(Bruno Rodrigues é consultor, especialista em informação para a mídia digital, mestre em Criação e Produção de Conteúdos Digitais pela UFRJ e autor do livro "Em busca de boas práticas de UX Writing" (2019).)

Sumário

  • PARTE 1 - FUNDAMENTOS PARA INICIAR EM PESQUISA DE EXPERIÊNCIA
    • 1. A produção de conhecimento
    • 2. Situando a pesquisa de experiência
    • 3. Campos de diálogo da pesquisa de experiência
  • PARTE 2 - ETAPAS PREPARATÓRIAS DA PESQUISA DE EXPERIÊNCIA
    • 4. Plano de pesquisa de experiência
    • 5. Vieses cognitivos e pesquisa de experiência
    • 6. A descoberta dos dados
    • 7. Recrutamento
  • PARTE 3 - MÉTODOS FUNDAMENTAIS DA PESQUISA DE EXPERIÊNCIA
    • 8. Desk research
    • 9. Entrevistas individuais ou em profundidade
    • 10. Entrevistas em grupo
    • 11. Etnografia ou observação: o que estou fazendo?
    • 12. Pesquisa contextual
    • 13. Teste de usabilidade
  • PARTE 4 - RESULTADOS
    • 14. Síntese e análise dos dados
    • 15. Comunicação dos resultados
  • PARTE 5 - A PESQUISA DE EXPERIÊNCIA NA PRÁTICA
    • 16. Implicações éticas e a nova lei geral de proteção de dados
    • 17. Casos reais
    • 18. Materiais complementares
    • 19. Agradecimentos

Dados do produto

Número de páginas:
432
ISBN:
978-85-5519-319-4
Data publicação:
11/2022

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*Você terá acesso às futuras atualizações do livro.